sábado, 4 de outubro de 2014

Exu e o Brasil em cartas de Tarô

"XV - O Diabo: Exu".
Pintura de Israel Pedrosa para a série
"O Brasil em cartas de Tarô"
 
No fim dos anos de 1980, o artista Israel Pedrosa, autor de um dos mais célebres tratados sobre cor já escritos no Brasil, criou uma série de pinturas onde retratava personagens da história brasileira como os arcanos maiores do baralho de tarô. Esta série pouco citada foi documentada em livro em 1991, sob o título de "O Brasil em cartas de Tarô", editado pelo extinto banco Crefisul, com tiragem limitada a 2000 exemplares.
Entre suas curiosíssimas escolhas, Pedrosa nos mostra, por exemplo, Antônio Conselheiro representando "O Louco", Lampião como "A Força", Padre Cícero como "O Papa" e Carmen Miranda como "A Estrela". Para representar "O Diabo", Pedrosa optou não por um personagem histórico ou literário, mas pelo orixá Exu. Abaixo lemos o trecho do livro onde o autor trata de sua escolha:

A CARTA

No Tarô, o Diabo revela o princípio de atividade espiritual na busca de penetração na matéria como meio de materializar-se. Símbolo da evolução no sentido da concretização, da riqueza e do triunfo. Expressão de uma das faces da origem divina, no reino das trevas desdenha o pensamento humano que o caracteriza apenas como força maligna. Ponto de equilíbrio entre as reservas do bem e do mal.
Antevisão das fraquezas humanas, dos delírios de onipotência, da transgressão da moral cósmica e do império dos instintos. Hermafroditismo. Magnetismo e poder oculto. Egoísmo, atração sexual e desejos passionais. Ausência de preocupação com os outros e com a justiça.

O QUADRO

O Diabo é sempre representado no Tarô com asas, guardando relação com o anjo expulso do paraíso. Símbolo hermafrodita, sua cabeça é ornada com galhadas, lembrando chifres de cervos.
Dois seres acorrentados ao seu pedestal simbolizam a escravidão ao mundo material e à animalidade humana.
No quadro que pintei, o diabo é Exu, orixá que outrora, na África, era reverenciado com sacrifícios humanos em ocasiões especiais, lembrança que aqui permanece na matança de animais votivos.
Em homenagem aos cultos afro-brasileiros, fiz a figura de Exu tomando por base imagens da ancestral arte bamileké, de forte influência do Benim.
O Exu aparece no quadro segurando as sete flechas, representação das sete espadas correspondentes aos sete caminhos de seus imensos domínios. Ele parece cantar e dançar um ponto de macumba ao som de invisíveis atabaques. À sua frente está o padê - despacho, oferenda -, com o ebó, o galo e cabrito pretos sacrificados na encruzilhada, a vela para iluminar os caminhos e a garrafa de aguardente para entorpecer os sentidos e liberar a audácia.
Suas cores preferenciais, o vermelho e o preto, aparecem em várias situações, no colorido da cena retratada.
A letra ס (samekh), vinculada à carta, está no lado esquerdo, na parte inferior do quadro.

PEDROSA, Israel. O Brasil em cartas de Tarô. São Paulo: Crefisul, 1991.

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